Os horários não são convidativos, testando ao limite a fibra dos apaixonados do futebol de formação. A Nova Zelândia, no outro lado do Mundo, recebe por estes dias o Mundial sub-20, a competição de escalões jovens mais importantes do calendário do futebol mundial.

Basta recordar que a prova revelou craques como Diego Maradona (campeão pela Argentina em 1979), Robert Prosinecki (símbolo da campeã Jugoslávia no certame de 1987), Roberto Carlos (no Mundial de 1991, ganho por Portugal e no qual Emílio Peixe foi o melhor jogador), Juan Román Riquelme (na Argentina de 1997, vencedora da competição), Ronaldinho Gaúcho (pelo Brasil, em 1999, quando Seydou Keita, do Mali, venceu o prémio de melhor jogador), Javier Saviola (melhor jogador e melhor marcador da competição ganha pela ‘sua’ Argentina em 2001), Dani Alves (em 2003, pelo Brasil campeão), Iniesta (no mesmo ano, pela vice Espanha), Lionel Messi (melhor jogador e melhor marcador pela campeã de 2005, a Argentina), Kun Agüero e Di Maria (que também levaram a selecção das pampas a vencer a edição de 2007), Oscar (que fez um hat-trick na final de 2011, quando o Brasil bateu Portugal na Colômbia) ou Paul Pogba (líder da vitoriosa França da última edição, em 2013).

Argentina festejando o título em 2005 (Foto: Getty Images)

A lista de craques é bem mais extensa que a apresentada acima. É verdade que há casos de potenciais estrelas que não confirmaram tudo o que prometeram nestes certames (vejam-se os casos do ganês Dominic Adiyiah, melhor jogador da edição de 2009, Ismail Matar, o melhor jogador de 2005, ou do próprio Emílio Peixe), mas pode-se dizer com propriedade que o Mundial de sub-20 é o grande barómetro para o futuro a curto e médio prazo do futebol global. A edição deste ano não foge à regra e os olhos dos grandes clubes estão postos na Nova Zelândia, à procura do novo Messi ou do novo Maradona.

Portugal marca presença enquanto vice-campeão europeu

Portugal carimbou a presença na edição deste ano (depois da ausência em 2013), após uma brilhante prestação dos sub-19 no Europeu do ano passado, apenas batidos pela Alemanha na final. E, mais do que marcar presença, enquanto vice-campeão europeu, o conjunto luso chegou ao evento com legítimas aspirações ao sonho de erguer o troféu. Não seria a primeira vez. Em 1989, na Arábia Saudita, Portugal sagra-se pela primeira vez campeão mundial no escalão sub-20. Como se tal proeza não bastasse, na edição imediatamente a seguir, realizada no nosso país, a equipa das quinas sagra-se bicampeã, batendo o Brasil na lotaria das grandes penalidades num Estádio da Luz vibrante. Confirmava-se o tremendo potencial de uma geração que ficou conhecida na história do futebol português como a “Geração de Ouro”.

Só em 2011 voltámos a ter Portugal em grande plano nesta competição. Um grupo manifestamente menos talentoso que compensava o menor fulgor técnico com uma entrega e dedicação nos píncaros. Acabou por cair aos pés do Brasil por 3-2 (após prolongamento), num jogo marcado pelos 3 golos apontados por Oscar, craque hoje ao serviço do Chelsea de Mourinho. Restou o consolo da medalha de prata e as distinções de melhor guarda-redes (Mika) e de segundo melhor jogador da competição (Nélson Oliveira, atrás do brasileiro Henrique).

Primeiro obstáculo: Grupo B, com Senegal, Qatar e Colômbia

Portugal chegou à Nova Zelândia sabendo já que para chegar aos oitavos teria que ultrapassar um grupo perigoso, composto pelo vice-campeão africano Senegal, pelo campeão asiático Qatar (a apostar forte na formação, para fazer boa figura no Mundial que vai receber dentro de poucos anos) e pela vice-campeã sul-americana e perigosa Colômbia. Hélio Sousa, o seleccionador nacional, manteve a coluna vertebral do grupo vice-campeão europeu no ano passado, numa convocatória que impressionava os mais atentos.

E os primeiros três jogos, da fase de grupos, provaram que quem deposita esperanças nesta geração não está enganado. Portugal venceu, convenceu, está nos oitavos e já é visto como um dos candidatos à vitória final.

Mas vamos por partes. A estreia nestas competições fica normalmente marcada pelo nervosismo. Não estivéssemos nós a falar de um certame importantíssimo e de jovens com pouca maturidade competitiva e pouco habituados aos grandes palcos. Portugal enfrentava o Senegal logo a começar, um desafio complicado na teoria, conhecida que é a qualidade habitualmente demonstrada pelas selecções africanas nos escalões jovens. Com um onze muito próximo do onze-tipo do Europeu do ano passado (a maior surpresa foi a titularidade de Gonçalo Guedes, relegando para o banco Ivo Rodrigues), Portugal dificilmente poderia começar a competição de melhor forma. Ainda não estava completado o primeiro minuto de jogo quando Portugal recuperou uma bola em zona perigosa para os senegaleses e Gelson Martins encostou para o fundo das redes. O nervosismo da estreia tornava-se assim mais facilmente suportável. Ainda assim, Portugal não encheu o olho no primeiro tempo. A equipa parecia um pouco desligada entre sectores e Rony Lopes, o mais mediático do grupo e o responsável por ligar meio campo e ataque passou completamente ao lado do jogo. No segundo tempo, Portugal apareceu melhor mas muito por fruto de uma melhoria exponencial da exibição do médio Guzzo que, com o mais defensivo Tomás Podstawski, dominou o meio campo. Porém, só com a entrada de Nuno Santos é que Portugal sentenciou o jogo. O extremo esquerdino assistiu André Silva na primeira vez que tocou na bola e, poucos segundos volvidos, aproveitou uma saída mal calculada do guarda-redes senegalês para, ele próprio, estabelecer o resultado final em 3-0.

Ganhar o primeiro jogo é meio caminho andado para assegurar a chegada à próxima fase neste tipo de competições. Mas houve pouco tempo para festejos. Três dias depois, Portugal enfrentava o Qatar na segunda jornada do grupo. Os asiáticos vinham de uma derrota pela margem mínima na estreia contra a Colômbia (0-1) e jogavam o tudo ou nada contra Portugal. Só que a equipa das quinas deu poucas hipóteses. Mesmo com alguma rotação no onze (Guzzo e Guedes passaram para o banco, substituídos por Chico Ramos e Ivo Rodrigues), Portugal bateu sem dificuldade os qataris (4-0), com dois golos de Ivo Rodrigues, um de André Silva e outro de João Vigário. A turma de Hélio Sousa carimbava logo à segunda jornada a passagem aos oitavos de final, com um score interessante de sete golos marcados e nenhum sofrido.

Quando entrou em campo para decidir o primeiro lugar do grupo com a Colômbia (que empatara a um golo na segunda jornada contra o Senegal), Portugal sabia que a igualdade chegaria para o objectivo de terminar na liderança e, por conseguinte, evitar um adversário na teoria mais complicado. Com três novidades no onze face aos dois primeiros jogos (Pedro Rebocho, Estrela e Nuno Santos) e o regresso ao onze de Guzzo ao meio campo, a equipa das quinas não se contentou com o empate e foi à procura da vitória. Voltou a marcar cedo, por Nuno Santos na conversão de um livre directo, e depois soube gerir o resultado, dilatando a vantagem já na segunda parte, quando André Silva marcou de grande penalidade. O mesmo André Silva faria o provisório 3-0 mas a Colômbia ainda conseguiu reduzir, por Rafael Santos Borre, naquele que foi o primeiro golo sofrido pelo guarda-redes titularíssimo André Moreira.

Forte a atacar e a defender... E já sem a Argentina

Três vitórias, dez golos marcados, apenas um sofrido. Isto num grupo equilibrado e complicado e com muita rotação à mistura. Hélio Sousa já utilizou 19 jogadores (só os guarda-redes Tiago Sá e Guilherme Oliveira ainda não têm minutos), mostrando que há talento para dar e vender neste grupo.

Nos oitavos de final, Portugal enfrentará a anfitriã Nova Zelândia (quinta-feira, às 8.30h na hora portuguesa), um dos terceiros lugares que acabaram repescados para a fase seguinte. Portugal parte como favorito, apesar do factor-casa estar do lado do adversário. Mais preocupante, na teoria, é o cruzamento nos quartos de final, onde o vencedor do Portugal-Nova Zelândia vai defrontar o vencedor do Brasil-Uruguai. Mas primeiro os neo-zelandeses.

Brasil, Alemanha e Portugal parecem ser os principais candidatos, vistos os jogos da fase de grupos. Sérvia e Ucrânia aparecem numa segunda linha, também com aspirações mais que legítimas. A surpresa foi a prematura e catastrófica eliminação da Argentina, selecção mais titulada nesta categoria e que chegou à Nova Zelândia como campeã sul-americana e grande favorita. Os argentinos fizeram apenas dois pontos num grupo composto ainda por Áustria, Gana e Panamá e regressaram em casa sem honra nem glória. Boas notícias para os restantes candidatos, entre os quais Portugal. Agora, que venha a Nova Zelândia.